29/09/2014

marolas


Abafado
som do surdo
coração cansado
de batucar peito alheio,
de voar desafinado.
Garganta em nó

a vida aperta
palavras que movem
nas pás do tempo
marolas verdes. (BF -22/10/2013)

17/07/2014

Eu pensei

Eu pensei que era amor
quando meio sem jeito
deitava no meu colo
sal, açúcar, açafrão.

Eu pensei que era amor
quando me abria o peito
desfolhava todo pudor,
cócegas no coração.

Eu pensei que era amor
quando ainda desfeito
dizia querer o remanso,
banho de imersão.

Eu pensei que era amor
quando à febre afeito
buscava na corredeira
verde-água de ocasião.

Eu pensei que era amor
quando por certo refeito
dava volta no calendário,
armadilha de roldão.


Eu pensava que era amor
quando sem preceito
pegava uma carona,
passageira de ficção.

11/07/2014

Corpos

Não lhe quero a alma,
mas o corpo.
Coração e cabeça
afinam traço,
às vezes não.
Descompasso
acerta as pernas,
o ritmo eriça,
a pele inflama.
Não lhe dou a alma
mas o corpo.

30/06/2014

Do tempo


Na gramática do viver
minha conjugação
se dá no passado.
 

De lá vêm em eco
versos e canções.
Acenos e razões
chegam tempos depois.

Futuro não conjugo
nem plural, nem singular,
não sei adiantar.

Mas eu quero aprender
como é trazer em laço
a embalagem do presente.

29/06/2014

Das águas

Sou praia de areia morna
de brisa que acolhe
coqueiro que canta
nuvem que abriga.

Sou onda da maré alta
de trovão que acorda
raio que ilumina
espuma que inunda.

Sou porto de água calma
de cais que recolhe
calado que suporta
verde que intriga.

Se...

teu canto me enternece
teu corpo me aquece
meus sentidos entorpece
ah, se eu soubesse...

28/06/2014

Cinzas

Levaram minha fantasia.
Era usada, até surrada,
mas ainda tinha brilho
do outro carnaval.


Disseram por aí
que a culpa era minha
que deixei na janela,
cuidei pouco dela.


Dum tombo caí
na triste armadilha
que o sonho atrela,
imobiliza na tela.


Na queima das cinzas
veio um gosto de sal
não era eu na fotografia
estampada no jornal

14/06/2014

Recuerdos

tua falta me dói menos
que tua imagem no sofá
aguardando no escuro
no chegar em casa só.

tua falta me dói menos
que tua voz dizendo
o tanto me gosta
no eco da madrugada.

tua falta me dói menos
que tua mão acendendo
meus pelos, minha pele
no tapete da sala vazia.
 

tua falta me dói menos
que teu sono ao lado
colado ao meu corpo
na cama desocupada.

tua falta me dói menos
que o contorno na parede
que teu violão deixou
na premissa da melodia.

11/06/2014

Agridoce


Ai, que noite!
a saudade se aninhou
debaixo das cobertas
na cama estreita
e você me laçou.
Arrepio de barba cerrada
nas minhas costas
premência na trança
na dança de pernas.
Dormi no gozo
da música que enfim
você tocou pra mim.
E quando abri os olhos
os seus envergonhados
desviaram para a janela.
Acordei agridoce.


08/06/2014

Só queria

Queria te falar
despido da capa
da indiferença
que não te cabe bem;
limpo do vício
da vingança,
perversa camuflagem.
Queria te falar
forro do medo,
da lança
que te dá coragem;
isento da culpa
da destemperança
do vai e vem.
Queria te falar
nua de virtudes.

04/06/2014

Sentidos


Tropeço em sombras,
lembranças, cheiros
esquecidos no canto.
Apuro o ouvido para
escutar no silêncio
sobras de risadas,
gritos de gozo, choro.
Sinto o traço da brisa
amornada e fugidia
pela janela fechada.
Aperto entre os lábios
sabor doce, meio acre,
flor de sal que mora
na saliva trocada.

03/06/2014

visitinha

não te espantes
com o perfume:
te visitei no sono
cobri teu corpo
e me abraçaste
enquanto roçava
a boça insone
teus olhos fechados.

29/05/2014

Era uma vez...

Tristinho,
asa quebrada
coração partido,
desplumado,
quase desapenado.

Por ninho
emprestei abraço
no bico tortinho
soprei calor,
naquele verão
cantou baixinho.

No inverno, voo
inda em desalinho
novo som entoando
trazia um raminho,
ia e vinha
trocando carinho.

Dez luas brilharam
cada vez mais perto,
buscando longe
novo abrigo
ia e vinha
trocando caminho.

Subiu tão alto
já não o via
perdido em nuvens.
De espinho ferido
tombou em redemoinho
de susto caiu perto
quedou sozinho
o passarinho.

26/05/2014

Ah, menina



Ah, menina,
não precisa chorar.
Seu amor tão grande
esparramado no ar
brinca comigo
em cada leito ou olhar.
Miro olhos castanhos
pinto de qualquer cor
desde que faça
meu mundo verdejar.

Ah, menina,
não precisa chorar
Afago seios rosados
afundo em ventre esguio
entre coxas morenas
é de você a alegoria.
Sinto o ácido da saliva
em lábios arredios
percorro nuca macia
em festa de arrepios.

Ah, menina,
não precisa chorar
Sussurro confidências
desmaio de prazer
privação ou demência
dentro e fora de você.
Sorvo da fruta madura
lambuzado sentimento
órfão mais que saudoso
deito pra descansar.

Ah, menina
Se quiser pode chorar.

21/05/2014

Carona

Estava sem pernas
você me carregou
deslizando marés
engatinhando morros
um cantinho de céu.
Não era peso.
Deitados na grama
me cobriu de rosas
Desfrutou.
Frutei-me.
Passou o verão
e mais outro,
o vento noroeste
abriu a porteira
pisaram na grama
mandacaru não floriu
Voei.

Engano

Derramou
dentro de mim
uma longa espera.
Não era eu, fugi

16/05/2014

Maturidade



Gosto quando vejo
nos olhos miúdos
do menino travesso
brincando no rosado
dos meus seios
lembranças de rosas,
caliandras, narcisos,
amores mais-que-perfeitos
numa dança de matizes
que o olhar embaça
E atiça.
Então me faço múltipla
nas tantas andarilhas
dos seus sonhos,
na sua boca me desfaço
e me disfarço em verso.